8.11.10

(Sobre o ENEM #2) Herdeira da ditadura,

... a tradição escolar brasileira não segue essas diretrizes. Ela é linear. As disciplinas são como cordas bambas paralelas: elas não se cruzam, não dialogam e o aluno não tem como se apoiar em mais de uma ao mesmo tempo, pois são distantes entre si - pelo menos mais que o alcance de suas pernas. O dia-a-dia do aluno não é problematizado. O contexto é o dos livros - distante, teórico, abstrato... distante. E muitas vezes irrelevante, posto que é visto como algo totalmente sem relação com o aqui e agora. Nossas escolas, de maneira geral, não sabem como trabalhar de maneira interdisciplinar, integrando teoria e prática, estimulando a reflexão e a crítica. Sequer ensinam o aluno a se posicionar diante do que quer que seja.

Agora imagine que você vai fazer um exame de curva glicêmica. Você acha que tem glicose baixa e não quer "fazer feio" no exame (?). O que você faz pra ludibriar os testes? Atola Coca-Cola com biscoito recheado! Consequências: um exame adulterado que poderá esconder problemas sérios de saúde. E uma dor de barriga, pra deixar de ser besta. É assim que eu enxergo os "cursinhos preparatórios pro ENEM" (?!?). Pelamorde, meu povo, falassério. Se seu aluno não aprendeu no EM a refletir, é uma aula de CURSINHO que vai ensinar? Gimme a break! Tem uma escola/cursinho onde moro que divulga seu curso preparatório assim: "ENEM - uma competição nacional". Competição. Tá com a gota!

O fato de as IES adotarem o ENEM era pra ser uma coisa boa também. Afinal, numa cultura escolar utilitarista, um exame só pelo diagnóstico só pra fins de check up não interessa a ninguém, né mermo? As escolas dariam importância ao ENEM, se pautariam por ele, já que não se pautam pelo que deveriam - os PCNs. Mas, é aquela velha estória: A MAIORIA DAS NOSSAS ESCOLAS NÃO TEM FORMAÇÃO PARA UMA EDUCAÇÃO CRÍTICA, REFLEXIVA, QUE UNA TEORIA E PRÁTICA, QUE EXIJA A ARTICULAÇÃO DE CONHECIMENTOS DE ÁREAS DIFERENTES. Mas qual delas está pronta pra admitir isso? Nananinanão. Você fez a curva glicêmica, se entupiu de bagana; seu exame mostrou que você é diabético e seu médico passou remédio pra baixar sua glicose. Por causa disso, você quase entrou em coma. A culpa é de quem? DO LABORATÓRIO, É LÓGICO.

Alunos, o ENEM tem problemas ainda, sim. Ele tem problemas a serem resolvidos, SIM. Mas acreditem: vale a pena investir nele. O fim dele seria o fim de uma jornada que a educação brasileira PRECISA trilhar. Por isso tudo, eu, como professora e educadora comprometida, apóio o ENEM. E espero que o povo (com ajuda do PIG) não fique crucificando o Fernando Haddad por causa dos problemas desse ano. O MEC é muito, muito mais, INFINITAMENTE MAIS que o ENEM.

Posts inspirados em debate bacana com @vitorsic.


OBS: não sou da área da saúde e posso ter falado bobagem na metáfora dos exames. QUem quiser me corrigir, o campo dos comentários está à disposição! =P

3 comentários:

Vitor Hugo disse...

O ENEM nem quando como checkup era muito bom.
Era mais ou menos assim, dependendo da nota que a escola tivesse no ENEM, os governos de cada estado teriam um panorama, digamos assim, de como os professores e os alunos estão interagindo, se o ensino está fraco (o que pra mim é pura furada, tendo em vista que muitos faziam o ENEM e marcavam qualquer coisa, só pra ir embora mais rápido) e com isso tomar medidas para sanar o problema. Ou seja, nada disso ocorria e o ENEM ficou só pra medir média nacional.

Quando veio o PROUNI melhorou muito o ENEM, porque aí tinhamos um motivo para fazer, nós do ensino público tinhamos uma chance melhor de ingressar na faculdade.

Daí resolveram que seria para também ingresso em Universidades federais e estaduais e virou vestibular. Gente se matando de estudar para tirar uma média alta no ENEM e entrar pela cota dos alunos do ENEM.

Daí vem uma coisa importante: O processo de inclusão virou exclusão, porque o ensino público continua ruim e decrépito, o que diminui muito a chance de um aluno carente que cursou o ensino médio em uma escola pública e não tem dinheiro para pagar cursinho consiga uma das vagas das universidades públicas, ou mesmo se conseguir por meio de milagre divino, terá muito mais dificuldade para se manter na universidade.

Conclusão disso tudo, a inclusão brasileira, não é nada mais nada menos que uma compensação da falta de respeito que há no ensino publico. mas uma compensação falha, como tudo nesse nosso Brasil, é uma inclusao numérica, desumana, desigual.

Carlos Barreto disse...

Posso estar falando bobagem, mas eu ainda acredito que a nova forma do ENEM não passa de uma politicagem barata. Daí o descaso em certos pontos da educação relacionados ao ENEM.

Ótima critica e o blog é sensacional. Parabens!!

se puder, segue o blog la.

PriAliança disse...

Poiséam, meninos. O lance não é o ENEM, é o uso que tem sido feito dele. Nossa ordem de coisas não sabe lidar com elementos baseados na importância inerente, somente com elementos baseados na rentabilidade a curto prazo.

Pergunto: o sistema de cotas tem funcionado nas universidades públicas dos estados de vocês? Além do ProUni, também duramente criticado, esse sistema foi desenhado pra dar a candidatos das rede privada e pública pontos de partida menos desiguais. Sabemos que existe a "inclusão excludente", como Vítor falou brilhantemente, mas a inclusão precisa começar a acontecer de alguma forma. Se a gente for esperar todas as condições necessárias pra fazer alguma coisa de maneira ideal e perfeita... ninguém faz nada nunca, certo?

Ainda tenho a impressão de que esse lance de cursinho pro ENEM é mais papo de dono de cursinho com medo de evasão. Não acredito que processos cognitivos que não foram desenvolvidos no processo educacional "legítimo", digamos assim, serão desenvolvidos em aulão expositivo pra mais de 100 meninos. E acho também que essa indústria dos cursinhos é a que mais perde com o sucesso do ENEM. E os caras tem grana, são influentes pra caramba. É importante filtrarmos o que ouvirmos por aí.

E lutarmos pra que o exame consiga assumir o papel que lhe tem sido negado.