26.3.11

Aos meus meninos

Eu ia escrever um post inteiro sobre o Seminário de Iniciação Científica que aconteceu sexta passada lá na escola, mas neste post Tertulino me poupou o trabalho. Ele disse muitas coisas que eu diria. Valeu, Tertu. Você sempre facilita a minha vida.

Pra mim, como coordenadora de pesquisa da escola, ver aflorar a formação científica - crítico-reflexiva - de meus meninos me proporciona um êxtase sem tamanho. Eu fico imensamente feliz. Eu incho de orgulho. Desde as menores coisas - como Edyellen, que fez sua primeira apresentação (há menos de um ano) parecendo um boneco de posto de gasolina e que, sexta, foi profissional, centrada e segurésima sobre o tratamento dado aos resíduos sólidos dos consultórios odontológicos do instituto. Como Kenned, que começou também tímido e inseguro ano passado - e que sexta era a coisa mais linda, todo encantado e seguro de sua pesquisa em geoprocessamento. Como Adria, debatendo questões metodológicas com um profe super cricri com serenidade e honestidade. Ou Êmmila, Dani e Pedro, que souberam do SIC e desejaram tanto participar que saíram à caça de um orientador - e desenvolveram um MEGAPROJETO que trará benefícios pra educação da rede pública do Vale do Assu inteiro (CARACA!). Leandro, com suas reflexões sobre Saramago e Romano de Sant'Anna; Nayara e Ondjaki, Ítalo e Marcelino Freire, Mariana e sua lagarta-do-cartucho, Caíque e sua mancha aquosa, Jailma e João e seus experimentos com reaproveitamento de óleo de cozinha. Nossa, a lista é enorme.

Meus meninos.

Lembro como se fosse hoje de abril de 2009, quando assumi a pesquisa. Foi um ano de muitos desafios: estruturar um setor inteiro, recém-criado. Os alunos veteranos sequer conheciam os eventos científicos do instituto. Nunca haviam ouvido falar em edital ou em bolsa de IC. Aliás, nem se sabia o que danado era IC. A divulgação dos editais internos era tão precária que - pasmem - SOBRARAM BOLSAS. Meus meninos não faziam ideia do que fosse um artigo científico e acreditavam que pesquisa era o ctrl + c, ctrl + v direto da Wikipedia.

Os problemas foram inúmeros e, pra minha alegria, não enfrentei nenhum deles sozinha. Tive o apoio e a compreensão fundamentais tanto da gestão, quanto dos servidores - e, mais importante de todos, o apoio e a compreensão dos... meus meninos. Muita coisa deu errado. Muita MESMO. Mas mesmo com muito dando errado, os resultados sempre apareceram - graças, PRINCIPALMENTE aos... meus meninos. Os meus meninos que não se envergam diante de uma dificuldade. Nem de várias.

Hoje eu saio do cargo sabendo de duas coisas: (1) muito do que eu tinha que fazer eu não dei conta; (2) muito do que tinha que ser feito foi feito. Dois anos depois, meu campus tem alunos engajados em pesquisa desde o primeiro período. Alunos que procuram servidores que os possam orientar; que descobrem datas de inscrição em eventos antes mesmo de mim;  que ficam no nosso pé pra saber quando vai sair o edital pras bolsas de IC; que querem colaborar, mesmo que como voluntários, com projetos de pesquisa pelos quais se apaixonam. Alunos que conhecem sua escola. Conhecem as oportunidades que ela oferece e aproveitam cada uma delas. Conhecem a vida que sua escola leva fora da sala de aula. Esses são os meus meninos.

Sexta-feira foi um momento muito simbólico pra mim. Pude ver que a escola hoje é profundamente diferente do que era quando a coordenação de pesquisa surgiu. Essa é uma vitória da qual me orgulho - mas NUNCA poderia me orgulhar dela sozinha. Nada do que fiz eu fiz só. Essa vitória eu compartilho com cada servidor, cada aluno, cada pesquisador - servidor ou aluno. Parabéns. Este interior pobre do Nordeste não é e nem será o mesmo graças à atuação brilhante de meus meninos. Meus meninos transformam sua realidade.

Parabéns, especialmente, pros meus meninos.

17.3.11

O dia em que meus alunos citaram Foucault

Lembram da reflexão sobre marcas de estrangeirização que meus alunos fizeram? Em algumas turmas, a aula seguinte teve um momento com "Estrangeirismo". Pedi então aos alunos que, à semelhança do eu-lírico nesta canção, fizessem um exercício de observação e registro do espaço em que viviam (fosse urbano ou rural). Eles deveriam coletar marcas de estrangeirização em suas próprias cidades/comunidades. Depois se organizariam em grupos por cidade e apresentariam os dados coletados. Ao fim da apresentação, deveriam apresentar à turma uma conclusão baseada na observação.

Hoje, na turma deste cidadão, as apresentações foram excelentes. Os alunos, em geral, fotografaram as marcas e pudemos todos visualizar cada uma delas com bastante concretude. Perceberam a relação entre o "tamanho" da cidade e a presença das marcas de estrangeirização - quanto maior, mais economicamente desenvolvida a cidade, mais marcas se apresentam. Mas eu quero chamar atenção para algumas das conclusões a que os grupos chegaram:

  1. um grupo afirmou que a escolha por um termo estrangeiro ou estrangeirizado não era meramente linguística: havia um componente ideológico por trás, uma relação de poder;
  2. de acordo com outro, a presença dessas marcas compõe um traço discursivo, uma forma de se posicionar em relação à cultura alheia (de acordo com FOUCAULT - DÁ PRA CRER?!)
  3. um outro grupo recorreu a uma fala atribuída a Nelson Rodrigues:
"O Brasil sofre de um complexo de vira-lata. Como um Narciso às avessas, que cospe na própria imagem."
Hoje eu me perguntei se esses meninos são realmente alunos de Ensino Médio.

3.3.11

Colorindo minhas mãos e as tuas

Esta primeira semana de sala de aula tem me deixado bastante satisfeita. Não que tudo tenha dado certo - LOOOONGE DISSO - mas tive a oportunidade de perceber algo que é precioso a qualquer educador: transformação no discurso de seus alunos.

Preparei uma atividade de aquecimento que decidi utilizar nos 2os anos que foram meus ano passado, no 3o que nunca foi meu e com as turmas calouras de PROEJA. Ela envolve pouca LI, algum conhecimento de história e muita, muita reflexão.

A atividade começa assim: aviso aos alunos que eles vão receber a letra de Brasil com S com as estrofes fora de ordem. Eles precisam, sem ouvir a música, tentar descobrir a sequência correta. A idéia é que eles recorram ao próprio conhecimento de mundo pra reconhecerem as referências históricas contidas na letra e usá-las pra definir uma ordem - cronologicamente. Dentro de cada estrofe os versos também estão fora de ordem, mas eu não sugiro uma estratégia específica pro unscrambling - deixo-os à vontade pra usarem o critério que quiserem.

Após o unscrambling, coloco a música pra tocar pra que eles confiram se fizeram as mesmas opções do autor. Curioso perceber que eles estabelecem muito rapidamente que o refrão vem ao final de cada estrofe e que, mesmo sem ter muita clareza dos critérios que usam, acertam sempre a ordem das estrofes e quase sempre a ordem dos versos. Peço que eles me falem sobre as estratégias que eles usaram, como chegaram a esta ou aquela sequência e deixo sempre bem claro que eu estou preocupada com essas estratégias, não com o acerto/erro (e é verdade, viu?). Ponho a música pra tocar e eles conferem.

A emoção começa aqui. A idéia é levá-los a refletir sobre a importância da grafia de um nome para a sustentação da identidade que esse nome carrega. Brasil escrito com Z não é literalmente a preocupação do eu-lírico, mas preocupa-o a noção de que a identidade do BraSil seja aos poucos preterida em favor da identidade de um BraZil.

Achei bem interessante perceber a diferença entre discurso dos alunos calouros (adultos) e o discurso dos veteranos. O discurso inicial dos calouros estava permeado da ilusão de neutralidade que o ensino de LI tanto prega hoje: "inglês é a língua universal"; "a língua mais falada"; "o nome BraZil é mais 'aceitável' lá fora". Pareceu mesmo que eles tinham aprendido ao longo de sua vida escolar que é isso que o professor de LI gosta de ouvir (Ira Shor comenta esse comprtamento em Medo e Ousadia). Até o tom deles era meio "professoral", sabe? Já os veteranos apresentaram um discurso avesso. As marcas de neutralidade - quando houve - foram escassas e rápidas. Termos como "dominação", "língua dominante", "relação de poder" e "valorizar a identidade brasileira" estabeleceram a tônica da discussão.

Esses mesmos veteranos, quando calouros,  tinha o mesmo posicionamento dos hoje calouros. E eu posso deitar a cabeça no travesseiro hoje tranquila, sabendo que pelo menos alguma coisa eu estou fazendo direito.

2.3.11

#teacherfail

Eu sou uma professora de Língua Inglesa formada pela Universidade Federal de Pernambuco (referência nacional no curso de Letras), com proficiência certificada com DISTINÇÃO pela Universidade de Londres (nível 4), mais de 10 anos de prática docente e muitas horas de estudo acumuladas - que hoje à tarde não soube soletrar "YES".

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